Atacante, ex-Botafogo e Flamengo, conta aventuras vividas no país e reitera que coração continua dividido entre o Glorioso e o Rubro-Negro
Conhecido por sua irreverência e pelos gols, é claro, Zé Carlos, o Zé do Gol, embarcou em uma aventura no segundo semestre de 2010. Buscou um mercado pouco usual para os brasileiros, o futebol boliviano. Assinou pelo clube mais tradicional do país, o Bolívar. Lá, "Zé del Gol" foi campeão e marcou 22 gols em 39 partidas. Mas revela que sua família sofreu com a altitude de La Paz (3.660m acima do nível do mar). Só não mastigou folha de coca.
- Não foi muito fácil para os meus filhos, o Guigui (4 anos) e o Lucas (9) sofreram no início, mas depois de 20 dias começaram a ir para a escola e passaram a se adaptar. Todo mundo ficava tonto, minha sogra ficava tonta. Você sente um formigamento no corpo, mas até que minha adaptação foi rápida. Foram dez meses, contando o Apertura e o Clausura. Disputamos 42 jogos e só fiquei fora de três. Fiz 22 gols, fomos campeões bolivianos (Torneo Adecuación de 2011) e nos classificamos para a Libertadores. Um certo atrito com um treinador argentino me fez voltar - explicou o jogador, de volta ao Brasil depois de junho.
Outra crítica feita por Zé é em relação à desorganização local. A única coisa a ser comemorada por ele era o baixo custo para fazer longos deslocamentos de táxi. Brincando, ele fala que é possível conhecer a Bolívia com apenas R$ 15.
- O trânsito era muito maluco, não tem sinal, não existe sinalização nenhuma. Agora, era tudo muito barato. A moeda local é muito defasada em relação ao real. Com R$ 15, você consegue rodar a Bolívia inteira de táxi. E os taxistas ficam mastigando folhas de coca (risos). Às vezes é para melhorar a circulação deles, mas servia como um comprimido para ficarem elétricos.
Rubro-negro ou botafoguense?
Formado na base do Botafogo e com uma passagem marcante pelo Flamengo, Zé sempre revelou que seu coração é dividido em relação aos arquirrivais. Pelo Rubro-Negro, o amor vem de berço e tem uma lembrança marcante: a conquista da Libertadores, em 1981. Pelo Glorioso, o carinho e o respeito nasceram a partir do reconhecimento, de amizades e em razão da projeção que ganhou dentro do clube.
- Tenho um respeito muito grande pelo Botafogo. Saí da categoria de base, fui criado em Marechal Hermes. Esse respeito não vai faltar nunca. O Flamengo é desde pequeno... Lembro da final contra o Cobreloa, me marcou muito. Meu pai saiu pelas ruas da minha cidade, no interior da Bahia (Ipirá, a 202 km de Salvador). Joguei um ano e meio no Flamengo e até hoje as pessoas me conhecem como jogador do Flamengo. Mas o respeito pelo Botafogo talvez seja até maior do que pelo Flamengo. O clube me projetou no cenário brasileiro, e passei sete anos na base. Meus melhores amigos foram feitos no Botafogo, como Sérgio Manoel, Túlio, Gottardo e Wilson Goiano.
Em defesa de Deivid
Embora coloque o Bota acima do Flamengo no quesito respeito, Zé, ao falar dos constantes pedidos que diz receber para que volte a vestir vermelho e preto profissionalmente, dá seus pitacos sobre o atual momento do atacante rubro-negro Deivid.
- Até hoje as pessoas me pedem para eu voltar para o Flamengo, dizendo que os atacantes de lá não fazem gols. Acho que o Deivid está deitando nos outros times agora. Ele é um artilheiro - disse Zé, defendendo o camisa 9 do seu clube de infância.
Mais Bolívia
Novamente citando a altitude, o atacante aponta o Campeonato Boliviano como um dos mais complicados que jogou.
- Para mim, foi o campeonato mais difícil e de todos em que atuei fora. E olha que joguei em Coreia, Chipre, Portugal... A Bolívia não tem esse futebol todo, mas a altitude é muito complicada. Jogávamos em La Paz com uma altitude de 4.200m. Depois, íamos para Cochabamba, no nível do mar. Era subir para Potosí, a 4.800m, e descer para Santa Cruz de La Sierra. A cabeça parecia que ia estourar e sentia uma dor de cabeça impressionante. O nosso corpo pesava, e o aparelho digestivo demorava muito para trabalhar. Devo ter ido umas 40 vezes para a câmara hiperbárica para me habituar, ficava por uma hora tentando oxigenar o corpo. Foi muito difícil.
Zé ainda revela uma curiosidade que contraria a fama de a Seleção Brasileira ser querida em todos os cantos do planeta. Segundo ele, por lá a torcida é sempre contra o Brasil.
- Percebi muito uma coisa que não esperava. Pensava que a rivalidade era só com a Argentina, porque o futebol deles é compatível com o nosso, mas também há uma certa bronca do Brasil. Pelo menos não estou na Argentina, parece que eles têm uma dor de cotovelo do Brasil, e não é para menos. A Argentina vive manipulando todos esses países. Brasileiro vai para jogar e mostrar nosso futebol, mas sofre. Escutava piadas nos jogos da Seleção, não torcem para o Brasil. Brasil x EUA, eles são EUA. Torcem para a França, não dão o braço a torcer.
Mais dois anos de carreira e brincadeira com o gol mil de Túlio
De volta ao Brasil no segundo semestre de 2011, Zé participou do Brasileiro de Showbol e não mostra pressa para conseguir um clube.
- Vão pagar para eu jogar? Eu me garanto. Mesmo com 36 anos, não vou querer ficar no banco, quero brigar por vaga. Já me procuraram, mas quero algo legal. Não quero me meter em furadas. Acredito que até o fim de dezembro tudo estará resolvido, mas tenho de esperar terminar a temporada - esclareceu.
Questionado sobre quanto tempo ainda tem de futebol, o experiente atleta fala em mais dois anos, estourando três, e provoca o ex-companheiro Túlio, hoje no Bonsucesso.
- Minha programação é para mais uns dois ou três aninhos de futebol. Estou com 36, e para chegar aos 40 tem de ser muito Túlio Maravilha (risos). Não tenho conta como ele, mas alguns gols eu fiz para ser chamado de Zé do Gol. Essa corrida do Túlio atrás do gol mil é política pura (risos), mas ele é um cara gente boa. Fomos campeões brasileiros e do Rio-São Paulo pelo Botafogo. Ainda jogamos juntos no Juventude - brincou.
fonte: globo