Atleta disse que "jogaria até de graça" no Vasco em 2006 porque estava desesperado
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Trecho do depoimento de Leandro Amaral na 33ª Vara trabalhista do Rio
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Trecho do depoimento de Leandro Amaral na 33ª Vara trabalhista do Rio
As cifras são estranhíssimas. Os depoimentos, reveladores. O imbróglio jurídico que envolve Vasco, Fluminense e o atacante Leandro Amaral está repleto de histórias subterrâneas. O GLOBOESPORTE.COM teve acesso a alguns depoimentos do caso e à sentença do juiz Múcio Borges, da 33ª Vara trabalhista do Rio de Janeiro. O que emerge dos autos é que a situação de Leandro é complicadíssima. O juiz recusou completamente a tese de que o Vasco não teria direito a renovar automaticamente seu contrato. Pior, Leandro parece contraditório.
Imbróglio começou há quase dois anos
A história começa em 2006. Sem clube desde o fim de seu contrato com a Portuguesa de Desportos (em 31/3/2006), Leandro diz em seu depoimento que foi procurado pelo empresário José Renato com uma oferta do Vasco. Topou na hora sem se preocupar com a remuneração.
No depoimento, Leandro diz textualmente que “jogaria até de graça” porque tinha trigêmeos e já estava numa situação de desespero porque não jogava há quatro meses (leia no depoimento acima). Vasco e Leandro assinaram um contrato de risco, com salários de R$ 20 mil mensais - e duração de três meses.
Ao fim desse contrato, em dezembro de 2006, o jogador recebeu um aumento (passou a ganhar R$ 25 mil) e assinou contrato de um ano, com uma cláusula de renovação automática por mais um. O Vasco exerceu seu direito em dezembro do ano passado.
Mas, julgando ilegal a cláusula, Leandro entrou na Justiça e obteve a liminar que permitiu que assinasse contrato com o Fluminense. A sentença do juiz derrubou essa liminar. Veja no trecho abaixo:"A tese do reclamante de que a cláusula extra contida no contrato de fls.57/58 se traduz em “Condição Puramente Potestativa” não prevalece e se distancia da definição legal prevista no Código Civil. O silêncio do autor no tocante à necessidade expressa de sua anuência na cláusula de opção aponta para sua aceitação no momento vestibular da assinatura do contrato, onde previamente se estipulou tal cláusula."
Leandro diz em seu depoimento que tinha a garantia de José Renato de que conversaria sobre a renovação no fim de 2007 - e que decidiu sair do Vasco por causa dos constantes atrasos salariais e pela forma pela qual foi informado da renovação automática. Ele disse ter sido humilhado porque foi convocado durante um treino na frente dos outros jogadores. O problema é que essa “motivação” contrariou sua própria tese jurídica - a de que a cláusula era inválida. - Ele foi muito mal assessorado - diz um advogado que teve conhecimento dos autos.
Ex-empresário complica depoimento de Leandro
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Trecho do depoimento pessoal de José Renato, empresário de Leandro Amaral
Pior é o que afirma José Renato em seu depoimento. O empresário diz que, em abril de 2007, ou seja, pouco menos de um mês depois que Leandro renovou seu contrato, participou ao lado do jogador de uma reunião com meia diretoria do Fluminense numa churrascaria na Barra da Tijuca.
José Renato diz que a reunião aconteceu no dia 30 de abril com a presença de Celso Barros (presidente da empresa que patrocina o Fluminense), Paulo Totti (diretor do clube), Branco (coordenador de futebol) e o já técnico Renato Gaúcho. “... que no dia 30/04/07 recebeu telefonema do reclamante solicitando que o depoente comparecesse a um encontro com o sr. Renato Gaúcho, sendo que o depoente o acompanhou até o local, churrascaria Porção/Barra, e no local estava também Sr. Branco, Totti e sr. Celso Barros (presidente da Unimed), além do Sr.Márcio - sócio do depoente, que foi proposto ao autor o recebimento de R$ 80.000,00; que foi sugerido que o reclamante criasse um incidente na reclamada para forçar sua saída, inclusive uma briga com o Sr. Romário, o que foi prontamente rechaçado pelo atleta; que foi colocado pelo depoente e pelo reclamante que este tinha contrato com a reclamada e caso o Fluminense tivesse interesse deveria entrar em contato com o clube; (...) (Confira no trecho abaixo):
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Termo do depoimento de José Renato
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Termo do depoimento de José Renato
Em seu depoimento, Leandro não menciona esse encontro e diz que só recebeu uma proposta do Fluminense em dezembro - e através de Branco. Mas a proposta tricolor é outra fonte de estranheza no caso.
Segundo os autos, o salário do jogador no Fluminense é de R$ 20 mil mensais (coincidentemente o mesmo valor que ele aceitou ganhar do Vasco em 2006 quando estava parado). O juiz estranha o fato: "Ora, se o autor sustenta que as condições no CRV não eram favoráveis, resta totalmente incongruente e contraditória a assinatura de contrato de trabalho com o Fluminense Football Clube com salário de R$ 20.000,00 ( vinte mil reais) no mesmo valor que aquele recebido no CRV quando da assinatura do 1º contrato em setembro de 2006.
Não é crível que após brilhante Campeonato Brasileiro, onde se constituiu num principais artilheiros e craques do pais, recuse a receber R$ 100.000,00 no CRV para auferir o módico valor de R$ 20.000,00 no Fluminense, diante de seu patamar profissional.
"A conclusão do juiz é cabal. Ele diz que o contrato com o Fluminense contraria os princípios protetores do direito do trabalho - até porque Leandro teria passado a ganhar menos: "O contrato firmado com o Fluminense Football Clube contraria os princípios protetores do direito do trabalho, mormente a irredutibilidade salarial prevista no artigo 7º Inciso VI da CF/88; afronta, também ,o Principio da Razoabilidade e Boa-fé, outrossim, apresenta-se inexoravelmente contraditória a pretensão do autor em buscar a nulidade do contrato de trabalho com o CRV, sem justificativa consistente, onde receberia remuneração de R$ 100.000,00, quando, de forma temerária, amparado em liminar judicial, celebra contrato de trabalho com outro clube, com remuneração diametralmente inferior no valor de R$ 20.000,00." Segundo a avaliação de um jurista, que também teve acesso aos autos, a situação de Leandro Amaral é complicada.
O julgamento de um recurso para reverter a decisão do juiz da 33ª Vara pode demorar mais de um ano. Ou seja - mais do que a duração do próprio contrato com o Vasco. - Se quiser jogar, não tem jeito. Ele vai ter que negociar com o Vasco.