quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Casos pitorescos e a devoção de Maka: os quatro anos de Bruno no Fla


Goleiro demonstrava instabilidade no clube e tinha a companhia constante do amigo, que fez promessa: 'Não deixo ninguém chegar perto do Bruno'

Por Eduardo Peixoto e Janir Júnior
Rio de Janeiro
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Bruno e Macarrão julgamento crime Elisa (Foto: Vagner Antônio / EFE)
Bruno e Macarrão no banco dos réus durante o
julgamento (Foto: Vagner Antônio / EFE)


A passagem de Bruno pelo Flamengo entre 2006 e 2010 guarda casos pitorescos. Cenas como o goleiro correndo nu pela Praia da Barra para comemorar um título ou o passeio de jegue pela favela da Chatuba. Festas regadas a mulheres e bebidas também faziam parte dos bastidores, assim como diálogos com Eliza Samudio através de bate-papo na Internet durante viagens do time. Em seus quatro anos no Rubro-Negro, o jogador protagonizou histórias que desenham um pouco da personalidade do ídolo que virou réu no julgamento que acontece desde segunda-feira, em Contagem, por suspeita do assassinato de Eliza Samudio. Elas mostram a relação com Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão, amigo de longa data, que tinha devoção pelo ex-camisa 1.
Na reta final do Campeonato Brasileiro de 2009, enquanto Bruno era capitão e um dos principais líderes do elenco, Macarrão mostrou que o amor de amigo superou o de ser pai. O fiel escudeiro do goleiro só foi visitar sua filha recém-nascida duas semanas depois do parto, em novembro. A alegação:
- Não posso deixar o Bruno sozinho num momento tão importante (o time lutava pelo título). Não tem como – relatou Macarrão à época, fazendo jus à tatuagem que carrega nas costas: ‘Bruno e Maka. A amizade, nem mesmo a força do tempo irá destruir, amor verdadeiro’.
A amizade e o amor verdadeiro eram o combustível de Macarrão, que acompanhava Bruno diariamente nos treinos do Flamengo. Na Gávea, revezava-se entre assistir à atividade e tomar café no restaurante "O Mais Querido da Gávea"; depois, passou a ter trânsito livre no Ninho do Urubu.
Bruno e Macarrão (Foto: Globoesporte.com)Bruno e Macarrão juntos quando estavam em liberdade: companhia constante (Foto: Globoesporte.com)
Macarrão organizava a vida de Bruno. A ele eram designadas algumas funções, como planejar festas com mulheres que varavam a madrugada num sítio em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio. Macarrão enchia a boca para dizer que o amigo tinha até dez relações sexuais por noite. E sem preservativo. O amigo também era responsável pelo aluguel de lanchas para festas durante a madrugada nas águas da costa carioca, com bebidas, mulheres e sexo a bordo.
Quando o Flamengo ia jogar em Belo Horizonte, Macarrão viajava dois dias antes com a missão de organizar as festas no sítio de Bruno em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte. O amigo do goleiro fotografava um quarto repleto de bebidas e exibia com orgulho para pessoas presentes aos treinos do Flamengo.
Em 2008, Bruno, Marcinho, Diego Tardelli e Paulo Victor se envolveram em uma confusão com oito garotas de programa depois de uma das orgias no sítio do jogador.
Macarrão tinha a missão de organizar festas para Bruno e outros jogadores do Flamengo no Rio e no sítio do goleiro em Ribeirão das Neves (MG)
A confusão aconteceu porque Marcinho teria se desentendido com uma das meninas e a agredido. Duas prostitutas prestaram queixa contra o jogador e fizeram exame no IML. O motivo: Marcinho, a exemplo de Bruno, queria transar com uma das garotas sem camisinha. Com o “não” da garota de programa, o jogador perdeu o controle.
O zelo de Macarrão com Bruno ia além da organização de festinhas. Ele também monitorava as finanças do ex-camisa 1.
- Não deixo ninguém chegar perto do Bruno. Tem muito interesseiro que só quer o dinheiro dele – disse Macarrão, em 2009.
Comemoração pelado e instabilidade emocional
Bruno chegou ao Flamengo em setembro de 2006. Logo no começo do ano seguinte, provou o gosto de ser campeão da Taça Guanabara. A comemoração terminou com Bruno tirando a roupa e correndo nu pelas areias da praia da Barra. Alguns amigos, entre eles Macarrão, esconderam os pertences do goleiro, que perambulou pelado por um bom tempo.
Bruno chateado no jogo do Flamengo (Foto: Getty Images)
O abatimento após a eliminação da Libertadores
de 2010 (Foto: Getty Images)
No dia a dia de Flamengo, Bruno demonstrava humor instável. Em alguns treinos, chegava sorridente e eufórico; em outros, exibia cara amarrada e nem dava “bom dia”. Um dos líderes do elenco, ele tinha o carinho e o respeito dos companheiros. Discutia premiações, e nem sempre lidava bem com más atuações.
Por mais de uma vez, quando falhava nos jogos, ele demonstrava extremo abatimento e chegava ao clube falando em encerrar a carreira. Foi assim nos dias seguintes a uma partida pela Libertadores, em maio de 2010. Depois da derrota do Flamengo para o Universidad do Chile por 3 a 2, no Maracanã, Bruno se desentendeu com a torcida. Antes, já mandara beijinhos debochados após o jogo contra o Caracas. Ao ser vaiado, o goleiro pediu que os torcedores gritassem mais alto.
A torcida gritou o nome de Júlio César. E o então camisa 1 disparou:
- Estou me lixando.
O goleiro foi questionado e teve que se explicar para líderes de torcidas organizadas dentro da sede da Gávea.
Passeio de jegue e a célebre frase: ‘Quem não saiu na mão com a mulher?’
Ainda em 2010, Bruno estava com Adriano no episódio que ficou conhecido como barraco da Chatuba. Então noiva do atacante, Joana Machado foi à favela atrás do Imperador, que se divertia pelas biroscas da comunidade.
Bruno, goleiro do Flamengo (Foto: Rodrigo Benchimol / Globoesporte.com)
Sorridente na Gávea: goleiro tinha comportamento
instável (Foto: Globoesporte.com)
Num acesso de ciúme e fúria, Joana passou a danificar carros de jogadores que estavam no local. Quando chegou a vez do veículo de Bruno, o goleiro não se intimidou com a presença de Adriano, discutiu asperamente com a noiva do atacante e fez insinuações sobre a vida sexual dela.
Com a situação resolvida, o goleiro montou em um jegue e passeou pela favela.
Uma semana depois, na véspera do Dia das Mulheres, Bruno saiu em defesa de Adriano, numa declaração com efeito de gasolina para apagar o fogo.
- Qual de vocês (jornalista) que é casado que nunca brigou com a mulher? Que não discutiu, que não até saiu na mão com a mulher, né, cara? Não tem jeito. Em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher, xará. Então eu acho que isso é problema pessoal do cara. E ele é o Imperador, e por isso que repercute muito, mas ele é um cara que tem sentimentos e é normal se abater um pouco.
A presidente do Flamengo, Patricia Amorim, tomou um choque com o teor da declaração e exigiu um pedido público de desculpa. No dia seguinte, Bruno abriu o coração e declarou amor a todas as mulheres do Brasil:
- Fui muito mal interpretado. Talvez, o termo que usei não foi o certo. Peço desculpas a todos. Hoje é o Dia das Mulheres. Tenho filha, ela vai crescer e virar mulher um dia. Todas as mulheres do Brasil merecem respeito e carinho.
Planos de se aposentar cedo, Igreja e fama de bad boy
Em 2008, aos 23 anos, Bruno já fazia planos de pendurar as luvas:
- Quero parar cedo. Com uns 32, no máximo 33 anos pretendo me aposentar.
Noitadas, festas... Isso não leva o jogador a lugar algum. Tenho de acertar a minha vida de vez. Quero deixar de ser considerado um jogador bad boy, polêmico... Quero seguir o caminho certo e estou pensando em entrar para a Igreja"
Bruno, em janeiro de 2010
A suspeita de assassinar Eliza Samudio interrompeu a carreira do goleiro em 2010. Hoje, ele tem 27 anos, e completa 28 no dia 23 de dezembro.
Outras entrevistas de Bruno ainda como jogador do Flamengo ficaram gravadas, como no dia 15 de janeiro de 2010, seis meses antes de ser acusado do sumiço de Eliza.
O goleiro buscava um encontro com Deus. E garantia o fim dos seus pecados.
- Noitadas, festas... Isso não leva o jogador a lugar algum. Tenho de acertar a minha vida de vez. Quero deixar de ser considerado um jogador bad boy, polêmico... Quero seguir o caminho certo e estou pensando em entrar para a Igreja. Fora das quatro linhas, eu sou um cara normal. Então quero que parem de me julgar antes de me conhecerem – declarou Bruno, em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM na pré-temporada do Flamengo em Porto Feliz, em janeiro de 2010.
Bate-papo virtual com Eliza e indisposição no Fla
Em 2009, Bruno sempre era visto em viagens do Flamengo nos saguões de hotéis conversando pela internet com Eliza Samudio, através de programas de bate-papo.
Roberto Barbosa com Bruno e Diego nos tempos de Fla (Foto: Cahê Mota / GLOBOESPORTE.COM)
Bruno e Roberto Barbosa (em pé), com o reserva
Diego (Foto: Cahê Mota / GLOBOESPORTE.COM)
Já com Eliza desaparecida - investigações da polícia indicam que ela teria sido assassinada no dia 10 de junho -, Bruno teve uma indisposição com Zico, que assumira o cargo de diretor de futebol. Com a troca de preparador de goleiros, Roberto Barbosa, amigo do camisa 1, foi demitido. Cantarelle assumiu a vaga.
Ao saber da troca, Bruno demonstrou irritação e passou por Zico sem cumprimentá-lo. Depois, ao tomar conhecimento da matéria sobre sua contrariedade com o diretor de futebol, o goleiro se dirigiu a um jornalista com ameaça:
- Toma cuidado porque não sabe o que pode te acontecer.
Isso aconteceu no dia 15 de junho, cinco dias depois da data em que a polícia diz que Eliza foi morta.
Irritação com jornalista e a declaração: ‘Sou inocente. Ainda vou rir disso tudo’
Alternando momentos de paz e guerra com jornalistas, em atividade do Flamengo em 2009, Bruno treinou com um exemplar do jornal "Extra" no pé da trave. A edição trazia acusações de Eliza Samudio contra o amante. Ao terminar a atividade, o goleiro deixou o campo e passou a caçar o repórter dizendo que “ele iria engolir - literalmente - o jornal”.
No fim de junho de 2010, já com seu nome sendo ligado ao desaparecimento de Eliza, Bruno treinou sorridente e declarou:
- Sou inocente. Ainda vou rir disso tudo.
Dias depois, sem motivos para sorrir, Bruno foi preso.
fonte: globo