sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Mundial pesa, e Di Matteo não resiste à ‘síndrome de novembro’ no Chelsea


Medo de tragédia no Japão é levado em conta, e Abramovich não repete paciência que teve com outros treinadores em crise no 11º mês do ano

Por Cahê Mota
Direto de Londres
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A obsessão por trás da demissão. A saída repentina de Roberto Di Matteo do comando do Chelsea, na quarta-feira, apenas seis meses e um dia após ser campeão da Liga dos Campeões da Europa, surpreendeu a imprensa inglesa, revoltou a maior parte dos torcedores e levantou uma questão: até que ponto os Blues perdem força para o Mundial ao trocarem de treinador a três semanas da estreia na competição? A resposta será dada dentro de campo, mas foi exatamente o risco cada vez maior de decepção no Japão, diante da crise técnica e de resultados atual, um dos principais motivos para que Roman Abramovich ignorasse a comoção pública causada pelo italiano - ídolo também nos tempos de jogador - e apostasse na entrada de Rafa Benítez.
Roberto Di Matteo Chelsea (Foto: AFP)Roberto Di Matteo deixou o Chelsea a pouco menos de um mês do Mundial de Clubes (Foto: AFP)
No clube ou entre os torcedores, ninguém faz questão de esconder que a competição organizada pela Fifa não é a prioridade na temporada e que ainda não tira o sono em um período recheado de partidas decisiva no Campeonato Inglês e na Champions. Uma teoria, entretanto, ganha cada vez mais força nos bastidores azuis: para o dono, ser consagrado como melhor clube do mundo é, sim, muito importante. E Abramovich levou isso em conta ao não dar a Di Matteo o crédito que deu a Felipão, Carlo Ancelotti e André Villas-Boas ao passarem pela “síndrome de novembro” que tem assolado o Chelsea nos últimos anos.
Felipão e Murtosa Chelsea (Foto: EFE)
Aproveitamento de Felipão em novembro nos Blues
foi de 47,6%: brasileiro ainda seguiu no cargo (EFE)
Se o fato de ter apenas 33,3% de aproveitamento nos cinco jogos realizados desde o início do mês deixam evidente a queda de rendimento da equipe (duas derrotas, dois empates e uma vitória, além da lesão do capitão John Terry, que voltará na véspera do Mundial), números semelhantes no mesmo período do ano não foram suficientes para demissão do trio citado acima nas últimas quatro temporadas. Desde 2008, com Luiz Felipe Scolari, o Chelsea teve desempenho aceitável no mês de novembro apenas em 2009, quando Ancelotti levou o clube ao “double” (conquista da Premier League e Copa da Inglaterra). Ainda assim, o atual técnico do Paris Saint-Germain contou com a paciência do russo ao somar apenas 45,3% em dezembro.
Abramovich manteve a calma ainda com os 50% de Felipão, 47,6% também de Ancelotti, em 2010, e até os 38,8% de André Villas-Boas, no ano passado, todos no décimo-primeiro mês do ano. O trio, é bom lembrar, foi demitido tempos depois, mas não de forma tão súbita quanto Di Matteo. Se levado em conta que o primeiro contrato como treinador foi assinado no início da temporada, e já com o respaldo do título mais importante da história do clube - antes era “interino” desde março, em substituição a Villas-Boas - o mais novo desempregado do mercado durou apenas cerca de quatro meses no cargo.
Rafa Benítez apresentado no Chelsea (Foto: EFE)Com passagem pelo Liverpool, Rafa Benítez foi apresentado no Chelsea na última quinta-feira (Foto: EFE)
O efeito Falcao García
Se a situação na Premier é completamente contornável - a equipe está em terceiro, com quatro pontos a menos que o Manchester City, rival de domingo - e na Champions fazer sua parte diante do lanterna Nordsjaelland, em casa, não chega a ser uma missão das mais difíceis, o risco de uma derrota no Japão surge como uma das explicações evidentes para saída de Di Matteo no primeiro sinal de crise. Não que Abramovich seja fissurado pelo Mundial de Clubes. O ponto em questão é a possibilidade de repercussão negativa fora das fronteiras da Inglaterra.
Um exemplo desta situação aconteceu há três meses, em Mônaco. Para torcedores e até mesmo parte do elenco, ciente de que se tratava de começo de temporada, o revés por 4 a 1 para o Atlético de Madri, na decisão da Supercopa da Europa, foi encarado com naturalidade, sem maiores alardes. O dono do clube, por outro lado, manifestou para pessoas próximas sua ira, principalmente pela forma como a derrota aconteceu.
- Abramovich ficou furioso quando o clube foi humilhado por Falcao García, mesmo que muitos não dessem grande importância para Supercopa. Para ele, era, sim, importante vencer. E o mesmo acontecerá no Mundial. É uma grande oportunidade para o Chelsea globalizar ainda mais a marca e se aproximar de nomes como Real Madrid, Barcelona, Manchester United e até mesmo Liverpool – analisou Matt Lewis, setorista do clube no jornal "Trinity Mirror".
Falcao García Atlético de Madri Chelsea (Foto: AP)Falcao García marcou três vezes na goleada do Atlético de Madri sobre o Chelsea pela Supercopa (Foto: AP)
A opinião é compartilhada por Bem Rumsby, que segue o clube pela "Press Association". O jornalista não tem dúvidas em afirmar que o risco de permanecer em curva descendente até a viagem para território japonês foi levado em conta pelo milionário russo, que não quer perder a oportunidade de começar o décimo ano do Projeto Chelsea com o status de melhor clube do mundo.
Abramovich ficou furioso quando o Chelsea perdeu Supercopa para o Atlético de Madri e quer de verdade ser mesmo coroado como melhor do mundo"
Bem Rumsby, da Press Association
- Acho que o Mundial foi um dos motivos para saída do Di Matteo agora e não mais para frente. Abramovich ficou furioso quando o Chelsea perdeu a Supercopa para o Atlético de Madri e ele quer de verdade ser mesmo coroado como melhor do mundo. Ele sabe bem o quanto é difícil chegar até essa competição.
Dúvidas cercam a chegada de Benítez
Rumsby, por sua vez, não está seguro de que a decisão de Abramovich foi acertada. E as dúvidas muito têm a ver com o nome escolhido para assumir o cargo de treinador. Com duas participações em Mundiais no currículo, Rafa Benítez tem, indiscutivelmente, mais bagagem do que seu antecessor. Entretanto, a ligação profunda com o Liverpool, que já gerou reprovação por parte do torcedor, e sua postura mais centralizadora causam apreensão.
- Sinceramente, não sei se o clube tem mais chances com Benítez. É um técnico que já venceu essa competição, mas como os jogadores vão reagir a chegada dele? Eles gostavam mesmo do Di Matteo. O espanhol já provou mais em sua carreira, mas sabemos que é controlador e frio com os jogadores. No passado, isso não funcionou bem com Villas-Boas.
Especialista em Chelsea com mais seguidores no Twitter, Dan Levene, do "Fulham Chronicle", é outro que prefere não fazer previsões. No assunto Mundial, porém, o repórter admite que a chegada de Benítez pode representar uma vantagem.
Roman Abramovich Chelsea troféu Liga dos Campeões (Foto: Getty Images)Roman Abramovich levanta o troféu da Liga dos Campeões (Foto: Getty Images)
- É preciso esperar. Uma coisa é certa: ele terá uma missão complicada para convencer torcedores que são contra sua chegada e, principalmente, a saída de Di Matteo. Ganhar o Man City, domingo, será fundamental para tornar tudo mais fácil. Por outro lado, a experiência no Mundial pode fazer a diferença. Ele já perdeu para o São Paulo, em 2005, e acredito que tirou lições disso.
Histórico no Mundial ajuda espanhol
Correspondente da consagrada revista "Sports Illustrated", Ben Lyttleton vai além e acredita que o histórico do espanhol na competição da Fifa foi preponderante para sua escolha.
John Terry chelsea gol liverpool (Foto: Agência Reuters)
John Terry também se lesionou em novembro e só
voltará às vésperas do Mundial (Foto: Reuters)
- Abramovich quer de verdade poder falar que seu time é o melhor do mundo. Benítez já ganhou a competição com o Inter de Milão, em 2010, e a leva a sério. Ele entende sua importância e tenho certeza que isso o ajudou a conseguir esse emprego. Dizer que o Chelsea está preocupado com a competição não seria muito exato, mas Abramovich quer muito vencê-la, definitivamente.
Entre os torcedores, a análise vai ao encontro da que é feita por quem vive o dia a dia do clube. Por mais que não seja o grande objetivo da temporada, o Mundial de Clubes pesou para saída de Di Matteo e, diante de sua proximidade, a chegada de um novo comandante pode gerar efeitos positivos a curto prazo.
– Sinceramente, não é um grande objetivo. A Premier e a Champions, mesmo quase eliminados, são as prioridades. Mas eu acho que há, sim, uma preocupação por um bom desempenho e a diretoria sentiu que o clube estava à deriva. Por esse ponto de vista, a mudança aumenta nossas chances no Japão – avaliou o torcedor Jeremy Sice, que seguirá para o Oriente com o filho.
Com contrato até o fim da temporada, em maio, Rafa Benítez demonstrou em entrevista coletiva já ter assimilado a mentalidade do novo patrão. Repetiu por várias vezes que chega ao clube para tentar levantar os cinco troféus que disputa. O primeiro deles é o Mundial, e vencê-lo será o primeiro passo para prolongar sua passagem por Stamford Bridge. Pelo menos até novembro, e todos os seus riscos.
FONTE: GLOBO