Futebol fica de lado na véspera do duelo pelo Grupo A da Euro. Marcha de russos por conta de feriado nacional preocupa autoridades de Varsóvia
Por Marcos Felipe
Direto de Varsóvia, Polônia
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O duelo entre Polônia e Rússia, nesta terça-feira, pela segunda rodada do Grupo A da Eurocopa, está tirando o sono das autoridades locais. Tanto por conta da conturbada relação histórica entre os dois países, como também pelas cenas de violência protagonizadas por hooligans russos na última sexta, na Breslávia, durante o jogo da seleção russa contra a República Tcheca.
Para complicar, está programada uma marcha de russos em Varsóvia por conta do Dia da Rússia. Em 12 de junho de 1990, legisladores do país deram início ao processo de independência do país da extinta União Soviética. A manifestação deve contar com cerca de 5 mil pessoas – boa parte delas também deve ir ao estádio Nacional.
Segundo a diretora da unidade de segurança e crise de Varsóvia, Ewa Gawor, os responsáveis pela marcha disseram que desejam apenas celebrar "o futebol” e a data, que é feriado na Rússia.
- Eu pedi para terem um comportamento pacífico, para não provocarem ninguém nas ruas. Queremos que tudo transcorra em paz. Tivemos as garantias, mas estaremos atentos - disse Gawor.
O primeiro-ministro da Polônia, Donald Tusk, chegou a pedir que os cidadãos poloneses marchem ao lado dos russos para celebrar o dia que “finalmente a União Soviética foi enterrada”. No entanto, a ideia não deve ser aceita, uma vez que os poloneses temem que os fãs russos exibam símbolos da era soviética, que os recordam dos 44 anos sob o domínio da extinta URSS após a Segunda Guerra Mundial.
- As pessoas mais velhas, principalmente, ainda têm alguma antipatia contra os russos por causa do regime comunista. Temo que possa acontecer alguns tumultos nessa passeata. Acho que os donos de bares e estabelecimentos no centro de Varsóvia precisam tomar muito cuidado – disse o jornalista Tomek Cwiakala.
A opinião é compartilhada por Petr Tereshenkov, repórter do jornal russo “Sport Express”, que faz um aviso.
- Muitos ultras vão estar infiltrados na marcha. E podem provocar os poloneses. Amanhã (terça) vai ser um longo dia...
O Ministro do Interior da Polônia, Jacek Cichocki, admitiu que será uma tarefa difícil organizar a passeata, mas disse confiar na polícia local que, inclusive, aumentou seu contingente para diminuir os riscos de distúrbios.
A princípio, a marcha parte do estádio do Légia Varsóvia, local escolhido pela "Associação de Torcedores da Rússia”, espécie de torcida organizada da seleção local e que não tem relação com hooligans. A federação de futebol do país, inclusive, preparou uma recepção para eles no mesmo ponto.
Lato: política e futebol não devem se misturar
Perguntado sobre o assunto, o presidente da federação polonesa de futebol, o ex-jogador Grzegorz Lato (artilheiro da Copa do Mundo de 1974 com quatro gols), disse confiar nas autoridades e que o foco deve ser o esporte.
- Não devemos misturar política com futebol. Só espero que os torcedores de ambas equipes deixem o estádio bonito, criando uma ótima atmosfera. Vai ser um grande jogo.
O discurso foi compartilhado pelo técnico da seleção da Polônia.
- Nosso foco está apenas no campo. Não podemos nos preocupar com isso - disse Fraciszek Smuda.
A conturbada relação entre Polônia e Rússia
Polônia e Rússia possuem uma histórica e complicada relação desde a Idade Média. No século XX, a situação se agravou no fim da I Guerra Mundial. Um episódio que retrata bem esse período foi a Batalha de Varsóvia, também conhecida como o Milagre no Vistula (rio que, curiosamente, passa ao lado do estádio Nacional, palco da partida desta terça-feira).
A batalha aconteceu em agosto de 1920, quando o Exército Vermelho comandado por Mikhail Tukhachevsky tentou invadir a capital polonesa. Apesar de estarem em menor número, as forças polonesas lideradas por Jozef Piłsudski contra-atacaram e superaram as forças rivais, quando a maioria dos especialistas estrangeiros considerava que a Polônia estava à beira da derrota.
Na II Guerra Mundial, a Polônia sofreu uma invasão da então URSS, no leste do país - enquanto os nazistas dominavam o oeste. Após a queda do III Reich, a nação foi governada pelos comunistas ligados a Moscou.
Um marco desse período, por sinal, é o Palácio da Cultura, principal ponto turístico da capital de Varsóvia. Imponente, no centro da cidade e com 230 metros de altura, o edifício foi inaugurado em 1955 e construído como um presente do líder soviético Józef Stalin. Por conta disso, muitos varsovianos não veem o local com bons olhos.
- Para alguns, é uma vergonha nacional. Para outros, um símbolo de um passado de conquistas. Muita gente acha inclusive que deveria ser colocado abaixo por ser um símbolo soviético. Eu só acho feio – disse o jornalista polonês Piotr Wierzbicki.
Queda de avião reacende rivalidade
O episódio de conflito mais recente entre os dois países aconteceu há dois anos. Em abril de 2010, o então presidente polonês Lech Kaczynskie morreu em um desastre aéreo em Smolensk, no oeste da Rússia. Um movimento liderado por Jaroslaw Kaczynski, gêmeo do ex-presidente e líder do principal partido de oposição da Polônia, questiona se a queda do avião foi um acidente e afirma que o governo russo pode ser pelo menos parcialmente culpado.
No último domingo, o técnico da seleção russa, o holandês Dick Advocaat, e outros membros da delegação, visitaram um memorial a Kaczynskie como forma de aliviar as tensões entre os dois países.
fonte: globo