Presidente reconhece falha na saída do ídolo rubro-negro e admite que Leonardo Ribeiro já foi seu funcionário na Câmara de Vereadores
Quando Patrícia Amorim sentou à mesa da presidência do Flamengo para mais uma entrevista, nesta quarta à tarde, na Gávea, o quadro com a foto de Zico continuava pendurado na parede da sala, ao fundo. Mas o ídolo rubro-negro não faz mais parte da diretoria. Saiu magoado com a dirigente. Segundo ele, Patrícia pouco o defendeu das acusações - dirigidas também a seus filhos - de supostas irregularidades em contratações e no contrato de parceria com o CFZ. As denúncias foram feitas pelo presidente do Conselho Fiscal do clube, Leonardo Ribeiro, o Capitão Léo, ex-chefe de torcida organizada. Patrícia assegurou que sempre esteve ao lado de Zico. Que não há qualquer fundamento nas acusações. E ainda não entendeu a sua saída. Fez questão de evitar o confronto e reconheceu uma falha.
- Eu me arrependo de ter me preocupado tanto em resolver os problemas do Flamengo e não ter tido mais conversas com o Zico. Mas ele também era uma pessoa ocupada. Nossas conversas aconteciam muito nas viagens, pré-jogo. E foram muito bacanas. O que eu aprendi com ele é comovente, a forma como se entregou... E é isso que eu vou guardar. Talvez eu não tenha percebido que havia uma necessidade de ficar mais perto dele. Mas não sei se ele pensa isso... Conversei com o Adílio sobre o Andrade e o Zico para tentar entender tudo - disse, sobre o fato de durante os dez meses de gestão ter visto dois ídolos do clube saírem magoados com suas atitudes.
A dirigente reconheceu que Leonardo Ribeiro, o Capitão Léo, foi funcionário seu na Câmara dos Vereadores, quando se elegeu vereadora, em 2000. Mas nega qualquer vínculo atual com o presidente do Conselho Fiscal, considerado hoje pela torcida rubro-negra o grande vilão da saída de Zico.
- Ele foi funcionário meu sim, mas há muitos anos. Como fui funcionária do Kleber Leite, trabalhei na gestão do Márcio Braga, do Helal, do Gilberto Cardoso, do Velloso.... Eu não tenho nenhum problema de falar sobre isso. Ao longo da vida, a gente estabelece algumas relações. Fazemos escolhas na vida e depois percebemos que não têm um caráter ideológico da forma com que você se propôs a caminhar.
Patrícia nega ter impedido Zico de ir ao Conselho Fiscal - "se o Zico quisesse se defender sobre isso, era um direito dele. Não foi impedido. Foi aconselhado". E reconhece que tem sido cobrada nas ruas e até em casa pelo triste desfecho da breve passagem do ídolo em sua diretoria.
- Meu filho fica em casa cantando "Ei, ei, ei, o Zico é nosso rei!".
Abaixo, mais trechos da entrevista.
SAÍDA DE ZICO
Eu não entendi a saída dele. Foi uma surpresa, além da forma como saiu. Quando ele me mandou o SMS, respondi: "Zico, respeito sua decisão. Mas não seria melhor conversarmos antes?" Ele não respondeu e postou no site. Ele tomou a decisão. A gente não conversou. Então, ficar conversando assim, pela imprensa, não vai construir nada, talvez até destruir uma relação que sempre foi muito boa. E quando ele me mandou o SMS, botou no fim: "Obrigado pela confiança." Então, pensei, a vida segue, ele decidiu.... Ai, quando o assunto veio à tona, de que eu devia bater na mesa, reagir... Eu inclusive puxei palmas para ele, ali, na frente dos jogadores... Não era o fórum para se conversar, eles tinham jogo no dia seguinte... Claro que ainda vou procurá-lo. Queria que ele participasse, inclusive, da campanha do tijolinho.
(Foto: Luciano Ribeiro / Globoesporte.com)
RESPEITO AO ÍDOLO
Com o Zico sempre fui elegante, sempre agi com respeito, e não vai ser diferente agora. Eu acho que o momento da vida dele é muito delicado, com a família, os filhos, eu também sou mãe... A diferença é que eu estou aqui, e ele saiu. E que fique bem claro: saiu porque quis sair. E não me deu a chance de conversar sobre essa saída. Postou no site de madrugada, depois foi se despedir dos jogadores. Daqui para frente, teremos que estabelecer um novo canal para entender o que aconteceu. Enquanto eu não tiver essa percepção absoluta, meu posicionamento vai ser sempre de respeito.
FALTA DE APOIO
No meu entendimento eu fiz tudo. Ele tinha autonomia para contratar. Não tinha interlocutor. Chegava aqui e dizia: "Quero contratar o Val Baiano, o Deivid, o Diogo, o Silas... Ele fez o que achou que era importante. Dei o respaldo. Agora, na política, não fui eu que o ataquei. Quando eu vim para a reunião, e quando o aconselhei a não vir para a reunião, não sabíamos que acusações eram essas. E uma vez que sentamos aqui e foram esclarecidas, percebeu-se que não havia má-fé ou qualquer problema que trouxesse prejuízo ao Flamengo. Eu só vou bater na mesa, virar leoa, quando tiver algum prejuízo ao Flamengo. O Zico tem que focar em quem atirou nele. Eu banquei o Zico, dei várias declarações sobre isso. O Leonardo Ribeiro (Capitão Léo) foi reeleito presidente do Conselho Fiscal. Tudo isso começou com denúncias do filho do Delair (André) e o Conselho resolveu investigar, e está no direito dele. Os poderes são os poderes do Flamengo. e aí não cabe se a gente gosta ou não da pessoa. Não vou bater boca com presidente de poder. Foi sso. Não sei por que houve essa dimensão toda.
ARREPENDIMENTO
Eu me arrependo de ter me preocupado tanto em resolver os problemas do Flamengo e não ter tido mais conversas com o Zico. Mas ele também era uma pessoa ocupada. Nossas conversas aconteciam muito nas viagens, pré-jogo. E foram muito bacanas... O que eu aprendi com ele é comovente, a forma como se entregou... E é isso que eu vou guardar. Talvez eu não tenha percebido que havia uma necessidade de ficar mais perto dele. Mas não sei se ele pensa isso. Conversei com o Adílio sobre o Zico e também sobre a saída do Andrade para tentar entender o que aconteceu. Estou tentando entender.
LEONARDO RIBEIRO (CAPITÃO LÉO)
Ele foi funcionário meu, sim (na Câmara de Vereadores), mas há muitos anos. Como eu fui funcionária do Kleber Leite, trabalhei na gestão do Márcio Braga, do Helal, do Gilberto Cardoso, do Velloso, e de muitos outros que passaram por aqui.... Eu não tenho nenhum problema de falar sobre isso. Ao longo da vida, a gente estabelece algumas relações. A gente faz escolhas na vida e depois percebe que não tem um caráter ideológico da forma com que você se propôs a caminhar. O próprio Capitão Léo teve uma chapa que ele apoiou, que foi a do Clóvis Sahione. Eu não o busquei. Ele aparecia nas campanhas para dar apoio. Tem muita gente que se aproxima assim. De uma forma inteligente, se aproximou de mim e de algumas pessoas e já chegou a duas eleições ao Conselho Fiscal.
diz Patricia (Foto: Luciano Ribeiro/ Globoesporte.com)
ZICO PARA A PRESIDÊNCIA
Ele, como qualquer sócio do Flamengo, tem todo esse direito. Mas é importante que se conheça toda a estrutura política do clube. Não é fácil, não. O desgaste político do dia a dia, as pressões... As pessoas aqui não pensam só o que é o melhor para o Flamengo, pensam no que é melhor individualmente. Fora que a paixão domina a questão racional. As discussões são acaloradas, de confronto. Não deveria ser assim, mas é. Quem conhece bem o Flamengo, suporta. É difícil governar, mas suporta. Essa é a diferença. Qualquer um pode ser candidato, e é nobre ele querer. Talvez se ele tivesse sido candidato numa outra época, eu o tivesse apoiado, como apoiei tantos outros candidatos que chegaram ao Flamengo e não disseram ao que vieram, não deixaram legado.
INGENUIDADE COM OPOSIÇÃO
Talvez ele tenha sido ingênuo. É mais fácil e menos doloroso ser ídolo, reverenciado, uma influência positiva, que ele será sempre. Mas quando assumimos um cargo político, estamos sujeitos a isso. Por isso eu trabalho há dez anos na política. Para conseguir entender. Um cargo de presidente do Flamengo é um cargo político. A gente lida todo dia com prestações de contas diárias, e não e só o torcedor cobrando os resultados. É o associado em cima de contratos, acordos... O Flamengo é um clube de 115 anos. Por aqui passaram todos os tipos de personagens. Os personagens que passaram aqui foram pagos, e os pagamentos passaram por orçamentos aprovados pelos seus conselhos. Então, o clube pertence aos seus sócios. Eu estou aqui de graça. Sou uma dirigente voluntária. Isso também tem que ser considerado. Essa disposição de estar aqui por amor ao Flamengo.
'Não tenho mágoa do Zico, tenho gratidão', diz Patricia Amorim (Foto: Luciano Ribeiro / Globoesporte.com)
ZICO SEM DEFESA?
A questão do contrato do Flamengo com o CFZ foi esclarecida. Simples. Tudo foi resolvido com o Conselho Fiscal. O assunto estava encerrado. Se o Zico quisesse se defender sobre isso, era um direito dele. Não foi impedido. Foi aconselhado. Por mim, pelo Vinicius França (então vice de futebol), pelo Rafael de Piro (vice jurídico). Agora, se ele queria fazer isso, tinha todo o direito, é adulto e tem capacidade. Só que é preciso ter total conhecimento do nosso estatuto e das prerrogativas do Conselho Fiscal.
os dois"
SEM MÁGOAS
Não tenho mágoa do Zico, tenho gratidão. O Flamengo está acima de todos nós. Eu tenho consciência disso. Que eu estou muito abaixo da grandeza do Flamengo. Isso é que é ser nobre, ser elegante, ser respeitoso com a instituição. O Zico é querido no Flamengo. O Flamengo tem a gratidão do Zico. Isso vai acontecer sempre. São indispensáveis. A associação entre Zico e Flamengo é extremamente benéfica para os dois. Para o clube, da minha parte, este assunto está superado. Ele saiu porque quis. Se quiser voltar, vai voltar. E da forma que quiser. Terei tranquilidade de conviver com ele em qualquer momento. É fundamental no projeto futuro. Ele plantou uma sementinha aqui, a construção do CT.
COMO FOI O DIRIGENTE
Ele diz que não foi bem, não contratou bem. Mas isso não saiu de mim. Achei a participação dele muito boa para a gente. Agora, se o jogador tal que foi artilheiro do campeonato passado chegou aqui acima do peso.. Não vou polemizar sobre isso. O Renato Abreu era um jogador que todo torcedor do Flamengo queria de volta. E não voltou nas condições físicas esperadas. Aprendemos uma lição. Na próxima vez, mandaremos um representante para lá para saber como o jogador está.
LUXEMBURGO
Ele tem uma contribuição a dar a esse Flamengo que parou no tempo com relação à estrutura profissional de futebol. Passou por grandes clubes no Brasil e no exterior. Assume o cargo de treinador, e também algumas funções de manager.
SUCESSOR DE ZICO
O espaço do Zico não será ocupado, por enquanto. O Luiz Augusto Velloso (ex-presidente) chega para trabalhar junto com o Isaías Tinoco (supervisor), e o Luxemburgo, para ocupar o hiato que ficou com saída do Eduardo Manhães (diretor de futebol). Parcerias, busca de jogadores. Como foi presidente, tem capacidade para isso. E ajudar a caminhar no processo de independência de que o futebol tanto precisa. Mas isso tem que ser feito dentro dos limites do estatuto.
DÍVIDAS COM TÉCNICOS DEMITIDOS
Começamos a cumprir o nosso acordo com o Andrade. Depósito do Fundo de Garantia, primeira parcela do acordo... Rogério Lourenço foi chamado, então também vai receber. O Silas, que ficou pouco tempo, também. O mais difícil no nosso fluxo financeiro é a dívida monstruosa de gestões anteriores. Mas nem por isso deixamos de pagar em dia, os jogadores estão satisfeitos.
fonte: globo