Em Belo Horizonte, irmão passa a controlar as companhias e até os horários do jogador. Polêmicas dos tempos de Fla desaparecem
Por Richard Souza
Rio de Janeiro
73 comentários
Foi um reinado curto, quase silencioso, mas incendiário. Um ano e quatro meses de regalias, com advertências internas que funcionaram mais na teoria do que na prática. Ronaldinho Gaúcho fez o que quis no Flamengo, sem alarde, sem discussões públicas, travando guerras frias com quem tentava fazer valer a hierarquia rubro-negra. Há quase quatro meses, o camisa 10 deixou o clube carioca pela porta dos fundos, com uma cobrança de R$ 40 milhões na Justiça e um histórico de indisciplinas quase sempre camufladas pelo departamento de futebol.
Nesta quarta-feira, Ronaldinho será adversário do Flamengo pela primeira vez desde a saída conturbada. O Rubro-Negro recebe o Atlético-MG no Engenhão, às 22h (de Brasília), em jogo adiado da 14ª rodada do Campeonato Brasileiro. Quem conhece bem o jogador diz que ele está diferente dentro e fora de campo. No Galo, reencontrou o bom futebol e é protagonista de uma equipe bem armada, que briga pelo título do Brasileirão. R49 é adorado pelos torcedores. Na Cidade do Galo, são comuns as filas de fãs em busca de fotos, autógrafos ou um simples aceno. Pelo menos por enquanto, comparecer aos treinamentos não foi problema para ele. Sempre pontual, sempre em campo. Cometeu apenas um deslize. Certa vez, já com o time concentrado dentro do CT, atrasou-se para descer do hotel até o gramado e chegou depois dos companheiros.
Diferentemente do que ocorria no Rio, o noticiário sobre a presença do jogador na noite de Belo Horizonte quase não existe. No Flamengo, houve um período em que a diretoria recorreu ao irmão e empresário do jogador, Roberto Assis, para controlar os excessos. Pediram a Ronaldinho que trocasse a diversão pública pelas longas festas privadas na mansão dele na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio. A polêmica coincidiu com a queda de rendimento do meia-atacante e os resultados ruins do time no Brasileirão. Depois, já com os salários do craque atrasados, o clube tentou, mas não conseguiu contê-lo.
Mas o que teria mudado tanto na vida de Ronaldinho em BH? A exposição é menor na capital mineira? Ou o comprometimento dele é maior no Atlético-MG? Pessoas próximas ao astro dizem que sim. Segundo amigos, Assis é o responsável pela mudança no comportamento do jogador.
- Não é que ele tenha parado de sair, entende? Nada disso. Ele continua saindo sempre, fazendo as coisas de que gosta. Mas houve uma mudança importante. O Assis tomou as rédeas. Os aliados do Ronaldo, as amizades, não são mais os mesmos depois que ele saiu do Rio – contou um amigo do camisa 49.
No tempo em que jogou no Flamengo, Ronaldinho Gaúcho tinha um fiel escudeiro. Gibão, amigo e cunhado, era o responsável direto por levar e buscar o jogador aos treinos no Ninho do Urubu e até por acordá-lo depois das madrugadas animadas. Com a mudança para Belo Horizonte, Gibão não o acompanhou e hoje vive em Florianópolis. A decisão foi de Assis, que pelo menos uma vez por semana assiste ao treino do irmão no CT.
- A vida que ele levava no Rio não é a mesma em Belo Horizonte. O Assis afastou os parceiros, entre aspas, porque percebeu que a carreira do Ronaldo estava sendo destruída. Derrubou todo mundo. O Assis está praticamente morando em Minas, virou o despertador dele. Depois de tantos anos na Europa, o Ronaldo começou a se deslumbrar, porque no Rio ele tinha tudo de que gosta. É mulher, samba, pagode, funk, praia. E aí juntou com a falta de pagamento do Flamengo, ele começou a dizer que não ia treinar, que não ia jogar. No Atlético-MG o Ronaldo é outro – conta outro amigo do jogador.
À vontade no Galo
Na chegada ao Atlético-MG, Ronaldinho morou por um tempo no hotel da Cidade do Galo. Chegou a ser vizinho do técnico Cuca, morador do CT. Depois, o jogador se mudou para um hotel cinco estrelas, o principal da capital mineira. Hoje, Ronaldinho vive em um condomínio de casas de luxo em Lagoa Santa, região metropolitana de Belo Horizonte. Mudou de clube, de cidade, de endereço, mas continua promovendo festas grandiosas que invadem a madrugada.
Aos amigos, o meia-atacante diz com frequência que está completamente à vontade no clube mineiro. O contrato termina em dezembro, mas ele cogita a possibilidade de ficar se o Atlético-MG for campeão ou conquistar a vaga na Libertadores. Apesar de algumas sondagens, entre elas uma do futebol grego, Ronaldinho não se mostra muito disposto a jogar fora do Brasil novamente.
No Galo, os jogadores mais próximos dele são Jô e Danilinho. No tempo em que jogou no Flamengo, Ronaldinho era o capitão dentro e fora de campo. O camisa 10 liderava a ala dos solteiros do grupo, mas a falta de compromisso do jogador passou a incomodar até mesmo os atletas mais próximos. O episódio mais marcante da passagem dele ocorreu em 16 de maio, às vésperas da estreia do time no Brasileirão. Ronaldinho chegou ao Ninho para o treino da manhã em más condições físicas e pediu para não treinar, segundo membros da comissão técnica. Recém-chegado, o diretor de futebol do clube, Zinho, precisou agir de maneira enérgica.
- Eu ia para as festas na casa dele, bebia com ele, curtia, mas falava: cara, você está errado. Está fazendo as coisas erradas. Ele me respeitava – afirmou um antigo companheiro, que preferiu não se identificar.
A relação de Ronaldinho Gaúcho com o Rio continua. Ele decidiu não se desfazer da casa que comprou quando foi contratado pelo Flamengo. Recentemente, aproveitou a passagem pela cidade e organizou uma festa na mansão após uma partida do Atlético-MG contra o Fluminense, no Engenhão, no primeiro turno.
Numa casa de shows na Zona Oeste do Rio, a ausência do jogador tem sido sentida. Ronaldinho era um frequentador fiel do lugar, batia cartão num camarote que é cercado por vidros escuros e garante privacidade aos frequentadores. Desde a saída do Rubro-Negro, no entanto, ele nunca mais apareceu.
O único problema
Se no Flamengo os dirigentes temiam Ronaldinho e se viam de mãos atadas para cobrar dedicação e responsabilidade do jogador, no Atlético-MG a direção age de maneira diferente. Antes do jogo contra o Vasco, em Belo Horizonte, o presidente Alexandre Kalil determinou que a concentração fosse antecipada em um dia. Capitaneado por Ronaldinho, o grupo atleticano contestou a decisão. Houve uma discussão entre o jogador e o mandatário diante de atletas e membros da comissão técnica. Kalil chegou a afastar o camisa 49 do jogo. A pedido dos jogadores, no entanto, reconsiderou, e o meia-atacante foi o melhor em campo na vitória por 1 a 0 sobre os cruz-maltinos.
FONTE: GLOBO