quarta-feira, 28 de março de 2012

No dia do adeus, Edmundo repassa carreira: 'Vivi uma vida de férias'


Ex-atacante, que se despede nesta quarta em amistoso entre Vasco e Barcelona-EQU, diz que gosto pelo Rio o fez desperdiçar chances de se projetar internacionalmente

Por Gustavo Rotstein
Rio de Janeiro


Na última vez que disputou uma partida, Edmundo chorou com os milhares de torcedores do Vasco, que amargou o rebaixamento para a Série B do Campeonato Brasileiro. Pouco mais de três anos depois, o dia é de sorrir. Empenhado em deixar uma última impressão feliz, o já ex-atacante, agora com 40 anos, promove nesta quarta-feira, em São Januário, às 19h30m (de Brasília), um amistoso de despedida dos gramados. O adversário é o Barcelona de Guaiaquil, no confronto que o Animal define como aquele que gostaria de ter disputado em 1998. Naquela ocasião, o time cruz-maltino conquistou o título da Libertadores já sem aquele que fora seu maior astro na campanha vitoriosa do Brasileirão um ano antes. A arbitragem será de Marcelo de Lima Henrique, auxiliado por Wagner de Almeida Santos e Jackson Lourenço. O SporTV transmite o jogo ao vivo, e o GLOBOESPORTE.COM acompanha em Tempo Real.
Nas últimas semanas, Edmundo procurou se condicionar da melhor maneira para o seu adeus. Ele realizou cinco treinos com o Vasco, que terá sua equipe titular contra Barcelona – já os equatorianos escalarão uma equipe reserva reforçada pelo veterano Nicolás Asensio, que disputou a final da Libertadores de 98. O objetivo do ex-atacante era estar o mais perto possível do nível dos demais atletas e, assim, segundo ele, não causar uma nova decepção. Mas em meio a tanta preparação, ele sabe que dificilmente conterá a emoção. O clube prepara uma série de homenagens a Edmundo, que começam antes de a bola rolar.
Edmundo São Januário Vasco (Foto: Gustavo Rotstein/Globoesporte.com)Edmundo em São Januário: local de sua despedida oficial será a casa do Vasco (Foto: Gustavo Rotstein/Globoesporte.com)
E nos últimos dias, Edmundo passou a limpo uma carreira de 16 anos como profissional. Foram títulos, atuações antológicas e polêmicas. Mas numa trajetória de altos e baixos, algo foi constante: o amor pelo Vasco, pelo qual atuou 240 vezes e marcou 135 gols. E o desejo de estar perto do clube e do país foi, segundo ele, algo que o impediu de ter uma projeção ainda maior, principalmente no cenário internacional. Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM, o Animal refletiu sobre sua caminhada e mostrou que a imaturidade da juventude foi seu maior marcador.
GLOBOESPORTE.COM – O ano de 1997 foi o mais marcante da sua carreira, com você sendo o principal nome do Vasco na conquista do Campeonato Brasileiro. Muito falam que você foi o melhor jogador do mundo naquela temporada. Concorda?
Edmundo – Isso é muito relativo. Hoje os europeus olham com mais respeito para o Brasil e para o nosso futebol. Não sou saudosista, sei que vivi bem aquele momento. Claro que gostaria de ter sido lembrado. Não fui, mas tenho a certeza de que os torcedores do Vasco acham que fui o melhor naquele ano. Isso é o que importa, porque naquele momento defendi e honrei a camisa do Vasco. Quando você trabalha bem e com afinco, está pago, é o retorno. Não sou vaidoso a esse ponto, não vivo de passado.
Ao longo daquela temporada houve o acerto entre Vasco e Fiorentina para a sua contratação. No fim de 1997, você foi para a Itália já campeão e consagrado. Em algum momento pensou em não ir?
Tudo é momento. Era uma negociação maravilhosa para o Vasco e para mim financeiramente. Não me arrependo. O problema é que depois que acertei com Fiorentina apareceram clubes de mais expressão interessados, o que poderia me dar mais projeção. Falavam em Milan e Chelsea. Fiquei muito ligado ao Vasco depois daquele título. Estava lá, mas com a cabeça aqui.
Na época você chegou a criticar Florença, dizendo que era uma cidade onde tudo era velho...
Ale e Edmundo no treino do Vasco em 1992 (Foto: Eurico Dantas / Ag. O Globo)
Edmundo em 1992, ano que estreou como
profissional (Foto: Eurico Dantas / Ag. O Globo)
Era uma questão de adaptação. Saí do Rio com 40 graus para uma cidade pequena e muito fria. Foi coisa de moleque. Às vezes a gente fala o que nem pensa. Para querer falar bem do Rio, falei mal de outra cidade. Em 2010 e no passado estive em Florença e incrivelmente fui reconhecido. Inclusive, fui na casa que morei. Agora os prazeres são outros. Tem a comida, o vinho... É uma cidade culturalmente fantástica, e agora enxergo tudo com outros olhos. Até de certa forma me arrependo por ter criado algum tumulto quando saí.
Acredita que se não fosse seu comportamento impulsivo naquela época, poderia ter atingido um patamar ainda maior na carreira?
Tudo na vida tem prós e contras. Quando fui para o Palmeiras, em 1993, tive propostas de uma série de clubes que não pagariam o mesmo que eu ganhava. Fui para a Fiorentina com 26 anos, uma idade considerada avançada, mas já com uma condição financeira boa. Mas acredito que se tivesse saído do Brasil em 1993 ou 94, teria mais projeção e maior respeito dos brasileiros em geral. Naquela época, havia especulações de Real Madrid, Barcelona e Paris Saint-Germain. O negócio é que a qualidade de vida do Brasil não se consegue ter em nenhum outro lugar do mundo. A gente acaba pecando por gostar de jogar aqui e de frequentar lugares que não são considerados ideais para atletas. Mas, sinceramente, fui muito feliz. Praticamente vivi uma vida de férias, porque no Brasil nós temos trabalho duro e lazer logo ao lado. Posso sair de um treino e ir à praia jogar futevôlei. Na Fiorentina, os jogadores ficavam oito meses programando as férias. Aqui nós temos férias todos os dias. Optei por isso. Sei que poderia ter jogado em times de maior expressão, disputado a Bola de Ouro e ter ido para a Seleção com mais moral. Mas não me arrependo. Fui feliz dentro da minha carreira e principalmente aqui no Vasco.
Você costuma dizer que não se arrepende de nada do que fez. Mas se pudesse voltar atrás, teria defendido o Flamengo, em 1995? Isso por se tratar do maior rival do Vasco, seu clube de coração.
Foi uma fase negativa dentro e fora de campo. Então, a gente tenta esquecer. Se tivesse a certeza de que daria tudo errado, não teria feito. Hoje, sabendo que deu tudo errado, não faria diferente. Mas não tenho absolutamente nada a falar do Flamengo. Fui apenas um jogador que passou por lá e não fez sucesso, como aconteceu com tantos outros. Fiz sucesso em outros clubes e principalmente contra o Flamengo, e isso acaba marcando. Não tem isso de rivalidade pelo fato de eu ser Vasco. Não tenho raiva. Procuro guardar coisas boas, pensar o bem. Tenho amor, carinho e respeito pelo Vasco, mas não é por eu amar o Vasco que tenho que odiar os rivais.
Que palavra ou frase poderia resumir a carreira que se encerra definitivamente nesta quarta-feira?
É difícil resumir em uma frase, mas o que eu poderia dizer para todo mundo de uma vez só é muito obrigado. Ao longo da minha carreira , recebi muita coisa boa e também dei. Diria que tenho muito que agradecer pela minha vida, por ter talento e saúde. Por isso, muito obrigado seria a frase ideal. Saí de uma família pobre e venci na vida, que é o sonho de todo brasileiro.
Prováveis escalações:
Vasco: Fernando Prass, Fagner, Dedé (Rodolfo), Renato Silva e Thiago Feltri; Romulo, Juninho, Felipe e Edmundo; Eder Luis (Wiliam Barbio) e Alecsandro. Técnico: Cristóvão Borges.
Barcelona: Morales, Mercado, Cedeño, Ordoñez e Espinoza; Torres, Rosero, De la Torre e Asencio; Bueno e Mina. Técnicos: Carlos Gruezo e Flavio Perlaza.
fonte: globo