terça-feira, 14 de julho de 2015

De viajante convicto a pacato cidadão da Suíça, Blatter mudou após prisões

Presidente da Fifa foi a eventos oficiais e percorreu cerca de 186.292Km entre final da Copa de 2014 e operações em Zurique. Após isso, perdeu três torneios importantes

Por 
Rio de Janeiro
INFO - linha do tempo Joseph Blatter fifa viagens 2  (Foto: Editoria de Arte)

Joseph Blatter sempre foi, enquanto presidente da Fifa, cidadão do mundo. Da final da Copa do Mundo de 2014 até o último Congresso da Fifa, em maio deste ano, quando foi reeleito, esteve em todos os eventos oficiais da entidade, um total de 21 viagens. Foram 186 mil quilômetros percorridos. Passou por Arábia Saudita, Sri Lanka, Noruega. Saiu de congresso de confederação no Bahrein para uma missão de paz em Israel e Palestina. Lançou projetos, até centro de treinamento nas Filipinas. Mas, desde que foi confirmado o seu quinto mandato - o qual já anunciou que não cumprirá -, o seu apreço por viagens esmoreceu drasticamente. Sepp Blatter prefere agora o conforto que só a terra natal pode proporcionar: o de não ter de se preocupar em ser extraditado para outro país.

Foram três eventos de relevância na entidade desde então, dos quais o suíço certamente participaria: a Copa América, no Chile, a Copa do Mundo feminina, no Canadá, e o Mundial Sub-20, na Nova Zelândia. A conta aproximada sobre a distância percorrida foi feita com base em distâncias aéreas, por latitude e longitude, considerando quase todas as partidas de Zurique, na Suíça, com exceção da viagem entre Israel e Palestina; da viagem para o Sri Lanka, na qual foi considerada partida das Filipinas; e da partida inicial, do Brasil, na final da Copa, para a Suíça. Desta data da decisão até o fim de 2014, Blatter percorreu 66.122 quilômetros. Do início de 2015 até as prisões em Zurique no dia 27 de maio, a distância aumentou significativamente: foram outros 120.170 quilômetros. No total, o suíço viajou aproximadamente 186.292 quilômetros

O suíço voou pelo mundo, em premiere cinematográfica (do filme "Die Mannschaft", em Berlim), reuniões das confederações continentais e finais e amistosos variados. Mas o ambiente atual para Blatter, fora da Suíça, é de fato de incerteza. Apesar de a investigação americana não ter chegado diretamente ao número um da Fifa, as suspeitas sobre vários dos figurões da entidade levam a crer que essa possibilidade existe, na medida em que o Departamento de Justiça americano já anunciou que mais está por vir.

Até o seu braço direito, o secretário geral Jérôme Valcke, se viu recentemente envolvido em denúncias com dirigentes sul-africanos - alegações que foram prontamente negadas pela Fifa. Ao contrário de Blatter, o francês deixou Zurique, mas em condições especiais. Ele se defendeu dessas acusações em uma coletiva na Rússia, já no dia 10 de junho, depois das prisões, mas discursou ao lado do ministro do Esporte russo, Vitaly Mutko. Seria difícil imaginar um cenário com a Rússia executando um mandado de prisão e extradição em cooperação com os Estados Unidos de um dirigente do alto escalão da Fifa em plena corrida pela organização da sua Copa do Mundo em 2018. Especialmente em um momento nada tranquilo da diplomacia tradicionalmente complicada entre os dois países.

Blatter pretende permanecer tão "low profile" quanto possível até a data da próxima eleição - na qual já confirmou que não será candidato. Essa data será marcada no próximo dia 20, para quando foi convocada uma reunião extraordinária do Comitê Executivo em Zurique. A janela anunciada no dia em que renunciou ao seu quinto mandato foi entre dezembro deste ano e março de 2016. 

Pela entrevista que deu em 15 de maio ao inglês The Guardian, menos de duas semanas antes da detenção de sete cartolas em Zurique, a perspectiva de Blatter nitidamente mudou. Além de ter garantido não estar evitando viagens aos Estados Unidos, o suíço prometeu estar no Chile para a Copa América:

- Se for eleito, irei. Mesmo se não for eleito, eles vão me convidar, tenho certeza.

Ele, na época, tentou não mostrar preocupação com a investigação, da qual tinha ciência. Não sabia, contudo, da extensão dos danos que provocaria. Indagado sobre Chuck Blazer e Jack Warner, dois ex-membros do Comitê Executivo da Fifa, serem alvos das investigações americanas, Blatter respondeu ao The Guardian:

- Eu sei, e todo mundo sabe, que há uma investigação em curso nos Estados Unidos contra pessoas que no passado estiveram em minha administração. Mas não é nada contra mim.

As prisões executadas pela Polícia Federal Suíça em cooperação com a Justiça americana no dia 27 de maio abalaram as estruturas da entidade e forçaram Blatter a abrir mão do quinto mandato, convocando novas eleições que serão marcadas na reunião extraordinária do Comitê Executivo no próximo dia 20. O encontro já é inevitavelmente cercado de expectativa pela possibilidade de novas detenções. E não é apenas o presidente da Fifa que tem receio. 

Enquanto Blatter não dá sinais de que pretende deixar a Suíça, o presidente da CBF, Marco Polo del Nero, reluta em retornar ao local onde seu aliado mais próximo até o fim de maio, José Maria Marin, trocou um hotel com vista para os alpes por uma cela. Del Nero vem sendo aconselhado a ir, mas ainda não tomou uma decisão definitiva. Pode, de última hora, decidir o contrário. Mas há outra reunião do Comitê Executivo marcada para setembro. A maior demonstração do seu estado de espírito foi a saída de Zurique sem alarde, na véspera da eleição presidencial e a dois dias de uma reunião importante no Comitê Executivo - que o deixou enfraquecido com a cúpula da Conmebol.
Twitter - Blatter - viagens (Foto: Reprodução)Blatter na reunião da Conmebol em março deste ano: maioria das viagens registradas nas redes sociais (Foto: Twitter)FONTE: GLOBO