quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Meu Tesouro: da sua maior derrota, Angelim guarda a camisa de Cabañas


Ex-zagueiro do Fla, que trocou blusa com carrasco na Libertadores-2008, autor de dois gols no 3 a 0 do América-MEX, dá detalhes da fatídica noite

Por Diego Morais
Direto de Juazeiro do Norte, CE
23 comentários
Pense no cenário perfeito para um grande espetáculo de futebol. Oitavas de final de Libertadores da América. Maracanã tomado por 50 mil pessoas. Flamengo contra o América-MEX. Rubro-Negro em campo sustentado por vantagem de 4 a 2 no jogo de ida. A classificação parecia garantida. A torcida estava em festa. O time acabara de ser campeão carioca sobre o Botafogo. Joel Santana comandaria seu último jogo antes de ir treinar a seleção da África do Sul. Caio Júnior assumiria. Para o 'papai' Joel, placa comemorativa e muitos aplausos. A emoção ecoava em cada canto do estádio na noite do dia 7 de maio de 2008. Mas, mesmo com todos esses adornos, a noite simbolizou um dos maiores fracassos da história do clube (relembre no vídeo). E a principal dor na carreira de um atleta que estava entre as referências daquele time - e que guarda, apesar do sofrimento, uma relíquia daquela jornada trágica.
- Foi a minha maior derrota no futebol - sentenciou Ronaldo Angelim.
O zagueiro fazia dupla naquela noite com Leonardo. Uma de suas principais tarefas era marcar o atacante Salvador Cabañas. No jogo de ida, tudo havia funcionado em perfeita ordem. O baixinho matador não conseguiu balançar as redes no México. No jogo de volta, porém, fez dois dos três gols que deram a vitória ao América. Um 3 a 0 que calou o Maracanã.
- Houve um pouco de oba-oba por parte dos nossos jogadores e até do nosso treinador Joel (Santana), que estava de saída. Houve um relaxamento. A gente entrou de salto alto e acabou jogando fora a chance de vencer uma Libertadores - contou o zagueiro.
Dessa grande tragédia para o torcedor rubro-negro, Ronaldo Angelim traz pelo menos uma boa lembrança, um tesouro que guarda com muito carinho: a camisa número 9 do carrasco Cabañas.
- É algo que eu vou guardar para sempre. Fiz questão de trocar a blusa com ele. Apesar de ter eliminado a gente, foi muito bom e importante. Ele era um grande jogador, diferenciado. E você pode ter certeza que, mesmo com a nossa perda, eu vou guardá-la pra sempre - disse Angelim.
Angelim mostra a camisa de Cabañas, ao lado de algumas camisas e quadros do Fla (Foto: Diego Morais / Globoesporte.com)
Angelim mostra a camisa de Cabañas, ao lado de algumas camisas e quadros do Flamengo
(Foto: Diego Morais / Globoesporte.com)
Uma camisa em troca de lágrimas
Ronaldo Angelim ficou com a camisa de Cabañas e talvez com ela tenha enxugado algumas das lágrimas que derramou naquela noite. O zagueiro ficou no vestiário durante a madrugada inteira e só deixou o estádio no comecinho da manhã. A dor maior, segundo o jogador, é foi fato de o time ter tudo para sair com a vaga, mas acabou decepcionando.
- Em 2008, nós tínhamos um elenco muito forte. A gente conquistou o Carioca e estava muito bem na Libertadores. Jogamos fora um título em um jogo no qual jogamos mal. Se não fosse isso, acho que ganharíamos aquela Libertadores.
A gente chegou ao Maracanã faltando quase cinco minutos pro jogo. E entrou sem nem aquecer."
Ronaldo Angelim
O Flamengo havia conquistado o Carioca no fim de semana anterior ao jogo da Libertadores. E isso, segundo Angelim, foi decisivo para que o time relaxasse muito antes de entrar em campo naquela noite. O zagueiro conta que o excesso de comemoração foi refletido na postura em campo.
- Nós não tínhamos nem descansado direito da conquista sobre o Botafogo. A gente achava que a vaga já estava garantida pelo resultado que fez lá. Tanto que, no dia do jogo, chegou ao Maracanã faltando quase cinco minutos pro jogo. A gente entrou sem nem aquecer. Acho que, se não tivéssemos sido campeões três dias antes, teríamos passado e conquistado a Libertadores.
Na torcida por Cabañas
A admiração e o respeito por Cabañas já existiam naquela época. Angelim conta que, nos rachões que disputava com os outros atletas, sempre jogava como atacante.
- No rachão do Flamengo, eu e Thiago Salles jogávamos de atacante. E quando a gente fazia gol, dizia que era Cabañas.
Quase quatro anos e meio depois daquela derrota, Ronaldo Angelim ainda guarda com carinho a peça de Salvador Cabañas. De lá para cá, continuou acompanhando a trajetória do atacante,  interrompida em janeiro de 2010 após ser baleado na cabeça, em uma boate na Cidade do México.
- O que aconteceu foi uma tragédia. Ele vivia um grande momento, era importante para sua seleção, para o seu clube. Acabou acontecendo essa fatalidade, e ele teve que dar um atraso na carreira. Tenho acompanhado tudo. Até porque a gente gosta de acompanhar a trajetória de jogadores como ele, que são diferenciados. A camisa ficou guardada na memória, e os gols dele também.
Cabañas ficou 810 dias sem jogar profissionalmente. Em meados de abril deste ano, retornou aos gramados na vitória do 12 de Octubre - seu time - sobre o Martín Ledesma, por 2 a 0. Desde então, participou de 12 das 22 partidas da equipe neste período como titular e, em outras duas ocasiões, foi a campo após sair do banco. No mês passado, o atacante de 32 anos acabou comemorando o título da terceira divisão paraguaia.
Cabañas dá volta olímpica após conquista da Terceirona paraguaia (Foto: Reprodução)Cabañas dá volta olímpica após conquista da Terceirona paraguaia (Foto: Reprodução)
Aposentadoria ainda não
O tesouro de Angelim está guardado com ele em Juazeiro do Norte, no interior do Ceará, sua terra natal. Vez ou outra, algum torcedor rubro-negro  pergunta ao zagueiro sobre aquele fatídico jogo. Sua volta por cima veio em 2009, com o gol do título brasileiro sobre o Grêmio (reveja a conquista no vídeo ao lado).
- Vou ficar para sempre na história do Flamengo com aquele gol. Estava no lugar certo - disse o zagueiro.
Mas 2012 não foi uma temporada muito proveitosa para Angelim. Ao encerrar o contrato com o Flamengo, no fim do ano passado, decidiu retornar para casa. Chegou a receber proposta e a negociar com o Fortaleza, mas, com uma lesão no joelho, acabou não acertando.
Em meados de abril, foi anunciado como reforço do Grêmio Barueri para a disputa da Série B do Campeonato Brasileiro. Participou de nove jogos e marcou um gol, antes de rescindir contrato no mês de julho.
- Eu fui lá pra ajudar a subir o time. Quando vi que o elenco não era forte para subir para a Série A, acabei vindo embora. Abri mão de um contrato muito bom. A equipe paga super em dia, mas eu sou correto com as pessoas. Quando vejo que o objetivo não vai ser alcançado, prefiro abrir mão para não prejudicar a equipe - afirmou o zagueiro.
Em Juazeiro do Norte, desde então, aproveita o tempo para ficar com a família, descansar e bater um bolinha com os amigos. Até tem disputado alguns amistosos na cidade com a camisa do rubro-negro local, o Guarani de Juazeiro. Detalhe: como atacante. É nesta equipe que o zagueiro de 36 anos pretende terminar sua carreira, mas não no momento.
- Estou vendo algumas coisas. Este ano não jogo mais. No próximo mês, devo começar a fazer meus contatos. Estou disponível ao mercado. Não tenho preferência por jogar Série A, B ou C. Não importa a divisão. Claro que você fica sempre esperando uma boa proposta.
O zagueiro quer jogar mais dois anos, pelo menos. Ele não descarta voltar ao clube onde é ídolo e onde estava antes de ir para o Flamengo.
- Existe a possibilidade, sim, de ir para o Fortaleza. Eu poderia ter ido para lá no começo deste ano. Mas quero me preparar bem e fazer uma pré-temporada com toda a equipe para poder jogar o ano todo em bom nível. Mas hoje não tem nada de concreto.
fonte: GLOBO